sexta-feira, 13 de março de 2009

ELE VAI FICAR NA HISTÓRIA


ELE VAI FICAR NA HISTÓRIA

Heitor Campos Botelho

Poucos seres humanos, na viagem pela vida, deixam marcas na história para serem lembradas através do tempo, principalmente por não terem jamais perdido a determinação e a nobreza de defender as condições de sobrevivência do homem no planeta, mesmo que isto torne muito cruel e dolorida a sua passagem.

Pessoas desta estirpe geralmente são lembradas após a morte, quando as novas gerações colhem o fruto do seu sacrifício.

Os povos e os poderes foram cruéis com grandes homens que mudaram a história da humanidade, pois pela inteligência, ideologia filosófica ou religiosa, incomodam aqueles que comandam os nossos destinos: o capital e o Estado.

Ambos sempre terão estes homens como inimigos, o primeiro, o capital, na voracidade pelo vil metal, sem nenhum pudor sacrifica a humanidade pelo lucro e a riqueza; o segundo, o Estado, pelos comandantes de todos os níveis e de todos os poderes, pois mesmo tendo a força do poder e das leis, silenciam, cegam e calam, por covardia ou interesse, mesmo conscientes de que não serão lembrados na história.

Quero falar que Sérgio Ulhoa Dani é um desses homens destemidos e obstinados, que lutam pelas suas convicções e através dos seus conhecimentos, de inteligência rara e profunda cultura, que não deixa suas idéias e ideais abalarem pelos percalços na sua luta pela sobrevivência do planeta Terra e principalmente pela qualidade de vida das futuras gerações da cidade de Paracatu.

Sérgio tem alertado toda a população com seu grito isolado, mas escudado na força do seu conhecimento de cientista, médico pela Universidade Federal de Minas Gerais, doutor em medicina pela Medizinische Hochschule Hannover (Alemanha), pós-doutor em biologia molecular pela Universidade de Osaka, no Japão, pós-doutor em genética do câncer pelo Instituto Ludwig (São Paulo) e livre-docente em genética pela USP, de que se persistir a atual situação de exploração de ouro pela mineradora transnacional RPM-Kinross na cidade, será negro o futuro quanto à qualidade de vida para o paracatuense.

A RPM-Kinross explora ouro num bairro de Paracatu, disto todos nós temos conhecimento, pois basta olhar para os lados do bairro Amoreiras, que vemos a poeira e ouvimos o barulho de suas instalações e operações, no que antes era um morro.

Dizem ser a maior mina de ouro a céu aberto do mundo e inauguraram esses dias um projeto de milhões de dólares, que fará com que sua produção de ouro a torne uma das maiores mineradoras de ouro do país.

A RPM-Kinross é, em arrecadação, maior e sente-se mais poderosa que a Prefeitura Municipal e sua atividade em nossa cidade lhe trará lucros, cujo exato montante nós jamais poderemos constatar, já que sua receita é auto-declara, a Prefeitura não fiscaliza. E a cidade e o povo, o que lucram com isto?

Todo o ouro retirado de nossa cidade pela RPM vai embora para longe, levado de carro-forte, helicóptero ou avião.

O que fica aqui é somente uma enorme represa de produtos químicos, acima do nível da cidade, o barulho, os tremores das explosões, a poeira, o buraco, a falta d’água, e algumas migalhas como um seminário de distribuição de valores a instituições em torno de pouco mais de duzentos mil reais por ano, mais impostos e compensações financeiras pela exploração do ouro que não chegam a 5% do valor líquido do ouro apurado. Dizem que movimentam a economia, nós não negamos. Mas geração de emprego e renda não é função social da propriedade, é apenas função econômica transitória.

Agora Sérgio Dani alerta que além da contaminação da represa, do barulho, dos tremores das explosões, da poeira, do buraco e da falta d’água, fica um problema invisível muito maior, pois a exploração de ouro pela RPM-Kinross dentro da cidade desprende da terra movimentada um mineral, o arsênio, que é letal para os seres vivos.

O arsênio está presente na poeira que desce da RPM-Kinross e do Amoreiras para a cidade, nós aspiramos o arsênio por todo o tempo e o arsênio causa câncer.

Se Sérgio estiver certo – e eu acredito nele – quantas pessoas amigas e parentes irão desaparecer até que o resto da comunidade, a prefeitura e os outros poderes instituídos acordem para o problema?

Quantas vidas hoje e amanhã serão perdidas, por não termos tido a coragem e o desprendimento de Sérgio Dani, quantas vidas irão embora porque não temos a coragem de lutar contra a poderosa RPM-Kinross, quantas vidas irão embora porque somos covardes?

Somente amanhã, se existir vida após a morte, veremos a conseqüência do nosso silêncio irresponsável, se tivermos condições de ver o sofrimento dos nossos filhos e netos.

Não há dúvida que a exploração de ouro pela RPM-Kinross, num bairro da cidade, é maléfica aos seres humanos, não há dúvida que a população tem medo de falar, não há dúvida que todos os poderes instalados no município são incapazes e omissos e não há dúvida que um dia escreveremos o nome de Sérgio Ulhoa Dani num painel dentro de uma cratera no bairro Amoreiras, local onde foi tirado o ouro e enterrada a dignidade de toda a comunidade, para que possamos ver o seu nome e sentirmos vergonha de termos sido a geração que jamais deveria ter nascido, pois prejudicamos o futuro.

Heitor Campos Botelho, cidadão paracatuense, advogado, foi vereador, procurador do município, secretário de assuntos jurídicos, e presidente da 31ª Subsecção da OAB-MG.

Um comentário:

  1. Animador ver que o grito de Sérgio Ulhoa Dani e Paulo Maurício Serrano Neve - dois paracatuenses adotivos que orgulham a cidade- começa a ser ouvido por outros importantes cidadãos.

    Adriles Ulhoa Filho

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